segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Meditação e Respiração

Meditação e Respiração

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Pedro Tornaghi

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A meditação começa onde a mente acaba. A meditação é um estado de consciência onde se percebe a vida sem a interferência da mente. Todas as técnicas de meditação das mais diversas linhas foram desenvolvidas para propiciar esse estado de percepção, mas nenhuma técnica é, por si só, a meditação. 
Para o indiano, a vida foi criada do encontro de Purusha (o espírito “imanifestado”) com Prakriti (a natureza palpável, o universo manifestado). Vivemos normalmente com consciência do reino do manifestado e inconscientes de nossa parte imanifesta. 
Purusha é a força organizadora que se encontra por trás da matéria, e está presente em todos os nossos momentos e atos. Cada um de nós tem uma contraparte pessoal no reino do imanifestado, o nosso “Purusha Individual”. Esse “Purusha Individual” testemunha tudo o que fazemos no mundo material. Meditação é estarmos conscientes de nosso Purusha – de nossa dimensão imanifestada – enquanto nos relacionamos com o mundo cotidiano. 
Muitas técnicas foram criadas para facilitar esse estado de consciência, algumas se utilizam de mantras, outras da respiração, de trabalhos com chakras e de diferentes posturas físicas e atitudes mentais e emocionais. Mas, há algo que é fundamental e que está presente nas mais diversas técnicas: o ato de “testemunhar” o aqui e o agora. Esse testemunhar nos deixa sintonizados com o Purusha e facilita com que progressivamente nos desidentifiquemos de nossa mente e enxerguemos mais amplamente a realidade. 
Como a atitude normal do Purusha é testemunhar aquilo que nos acontece, ao desenvolvermos a “arte de testemunhar o momento”, nos tornamos afinados com Purusha e isso acaba nos levando a percebê-lo em atividade. 
A mente vive de linguagens aprendidas no passado, dessa maneira, ao nos identificarmos com aquilo que pensamos, estamos sempre nos furtando a experiência presente. A mente se estrutura baseada em crenças. Cremos que somos de uma determinada religião, torcedores de um certo time de futebol, adeptos de uma tendência política; e vamos, com essas idéias, criando uma falsa sensação de pertencer a um grupo. Vamos criando uma falsa noção de nós mesmos, e perdendo a chance de nos percebermos em toda a nossa riqueza. A meditação atua no sentido oposto, e vai aos poucos diluindo nossas crenças, libertando-nos da estreiteza de visão e revelando a nossa capacidade de nos percebermos tal e qual somos. 
É normal nos contentarmos em pensar que somos o que indica a nossa posição social. Por exemplo, sou um astrólogo, ou médico, engenheiro, funcionário de uma empresa ou qualquer outra coisa. Mas, e se eu deixasse de ser esse profissional, continuaria sendo eu? Sim, claro. Quem sou eu então? Com frequência procuramos adjetivos para nos qualificar: sou um bom filho, um bom pai, um bom funcionário. Mas, se perco minha família ou meu emprego, continuo sendo eu, então, sou algo mais do que um filho ou funcionário. Muitas vezes, nossa mente nos leva a nos identificarmos com nosso corpo. Fazemos ginástica, cuidamos de nossa alimentação, dizendo a nós mesmos: “estou cuidando de mim”. Mas, se perdermos um braço, continuaremos sendo nós mesmos, se perdermos ambos os braços, e até as pernas, continuaremos sendo nós mesmos, inteiramente. Acabaremos percebendo que não somos nosso corpo, mas algo mais. 
Todas essas, são idéias que a mente cria de nós mesmos, e acabam substituindo o real contato, provocando o desconhecimento de quem somos em essência. 
Dentre os muitos caminhos para “desmontarmos” a idéia da mente acerca de nós mesmos, existem as meditações baseadas na respiração. A respiração é uma companheira interessante que carregamos conosco, mas não a usamos em todo o seu potencial. Algumas das funções de nosso corpo são ativadas com o nosso comando consciente. Por exemplo, posso pedir ao meu braço que se levante e pegue a xícara de chá para mim, posso pedir às minhas pernas que se movam, e me levem para a rua. Outras funções vitais, como a digestão ou os batimentos do coração, que nos acompanham diariamente, acontecem de forma independente de nossa vontade consciente. A respiração em parte pode ser controlada pela vontade consciente e em parte é independente dela. Posso decidir respirar profunda e lentamente, posso prender o ar ou não ao final de uma inspiração. Isso eu posso decidir, mas não posso pedir ao meu corpo que pare de respirar até que eu morra. 
A respiração se situa entre o mundo da vontade consciente e o nosso universo inconsciente, que funciona independente de nossa mente. Dessa maneira, ela se torna uma ponte valiosa entre o mundo que conhecemos e a parte que desconhecemos em nós. Pela respiração podemos em um primeiro momento acalmar a mente e isso é muito valioso para que possamos nos tornar livres dela. Não conseguimos nos jogar de um trem em velocidade, mas, de um trem lento, conseguimos saltar até com um certo conforto. A mente é um trilho do trem, nossa consciência “total” é o outro trilho. Os dois andam sempre paralelos, parecem que se encontrarão no horizonte, mas, se você chegar perto do horizonte, perceberá que eles não se encontram lá e entende que não se encontrarão nem mesmo no infinito. Para conhecer essa outra dimensão da consciência, é necessário saltar do trilho da mente. Nesse ponto, a respiração já começa a ajudar, aquietando-a. 
Em um segundo momento, a respiração é capaz de acordar o nosso corpo vital. A mente é por natureza controladora. Ela tenta controlar nossa realidade emocional e com isso, acaba interrompendo a fluidez das funções vitais, emocionais e físicas. O despertar do corpo vital pela respiração acaba possibilitando o liberar dos corpos vital, emocional e físico do corpo mental. 
Quando essa liberdade acontece, a respiração é capaz de nos libertar de condicionamentos que antes bloqueavam a nossa lucidez. 
Num terceiro momento, a respiração pode servir como ponte para que nossa consciência e capacidade de observação passem do palpável ao impalpável. A simples atitude de separar uma hora por dia, sentando-se confortavelmente e se dedicar somente a testemunhar a própria respiração já pode servir de passaporte para a ampliação da consciência, levando-a à sua potencialidade máxima. 
Como a respiração é um elo permanente entre o impalpável e o palpável, começamos por observar sua dimensão mais óbvia. Podemos observar o ar entrando e saindo de nós, o momento em que a onda do ar acaba de entrar e faz a volta para sair, ou como a barriga se mexe durante a respiração. Qualquer pensamento que passe pela cabeça nesse momento, devemos deixá-lo existir, sem brigar com ele. Em vez de tentar reprimi-lo, simplesmente trazemos o foco da atenção para o momento da respiração, e tentamos perceber o pensamento menos nítido do que percebemos a respiração. Como se ele estivesse desfocado. Aos poucos, uma revolução sem precedentes acontecerá em nós. Poderemos experimentar momentos da maior liberdade que um homem pode experimentar: a liberdade da própria mente. 
Se durante a viagem da vida a mente é como um dos trilhos do trem e a consciência plena o outro, cada respiração sua torna-se como um dormente que liga – a cada entrada e saída do ar – um trilho ao outro. Qualquer dormente desses pode servir como a desejada ponte entre a consciência comum e a extraordinária. Incluindo o da respiração que você está fazendo nesse momento.
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